sábado, maio 11, 2024

Caramelo


- Mas é só um cavalo...
 
- Não, senhor. É um cavalo equilibrando-se no espaço mínimo de uma cumeeira, para não morrer. É um cavalo que lutará até o último fôlego antes de se curvar às águas. É um cavalo que ainda espera um pouco de pasto. 

Veja os cascos dele, os músculos tesos, a cauda pensa – tudo imobilizado para poder viver. Sinta a energia guardada dentro dele. Quase se vê nela sua lembrança e esperança de um campo. 

Veja sua imagem multiplicada pela cidade, pelo país, pelo mundo.
E veja, mas veja mesmo, que o salvaram, que o sedaram, que o protegeram no embarque, que o deitaram no bote, que o levaram dali, que o reanimaram no seco, que o afagaram e o alimentaram. 

Essas imagens todas pairaram acima das águas e dos maus sentimentos, imagens de um cavalo salvo, vejam só, pela dedicação humana. Nosso reino salvo, naquele instante, por um cavalo. 
Para ser tão especial, ele só teve que ser um cavalo querendo viver, resistindo em sua própria barca às penas do dilúvio. E segue agora tendo o nome doce que alguém lhe deu, um nome a que deve atender, quando o chamem: Caramelo.

Por Alcides Villaça

quinta-feira, maio 09, 2024

Marinheiros

Rio Grande do Sul, tragédia anunciada. Nosso povo gaúcho precisando de ajuda, resgate, auxílio, carinho e amor para lidar com o seu nada. O país inteiro se mobiliza - em MASSA. Não é problema deles, é nosso problema. Somos só uma nação. Entenda! Dos Grandes aos Pequenos, dos que tem grana e os que mesmo sem grana, puxam campanhas, dinheiro, comida, roupa, ração, brinquedo... até brinquedo...sem medo, sem apontar dedos... fazendo direito! Báh, Oxente, Olha Só, Uai, trilegal!!!

- "Isso aconteceu porque eles tem muitos terreiros de macumba!" - grita a influencer com milhões de likes.LAROYÊ!🔱 

Enquanto isso...

Marinheiros no astral, com seus barcos espirituais, velando, reverberando sua marujada.

Em seus barcos, os Marinheiros trazem os Grandes Orixás, Nanã removendo o barro, Omulu e Yemanjá com seus portais, Oxum enxugando o rio com seu vestido, Xangô removendo pedras, Ogum trazendo coragem, Oxossi e Ossanha com suas medicinas e Oxalá emanando tranquilidade. 

- "Vejam... eu estou ajudando aqui com meus helicópteros e yates da Swat. Votem em mim!!!!" - diz um pseudo-politico num palanque de coach improvisado no meio da tragédia...LAROYÊ!🔱  

Enquanto isso...

Marujada trazendo em suas embarcações, Nossa Senhora que intercede pelas almas benditas - Adorei as Almas - e Jesus Cristo, trazendo conforto aos corações, São José, Maria, Amém! Eles falam "Cristãnês", o povo sente...Matnis!

- Eu não sabia de nada sobre as comportas do Rio Guaíba. Eu fui o último a saber... - se defende o prefeito do Porto Triste. LAROYÊ!🔱 

Enquanto isso...

Marinhada, trazendo em suas embarcações, o alforje aceso de Alá (Akbar) e o Maná do Yaveh, Deus Judeu, unindo o povo do Meio Oriente em suas vibrações para o Povo Gaúcho nos astrais e simbologias da vida que também vibra pedindo ajuda em outros planos.

Macumbeiros, Curandeiros, Rezadores, Tupã, Devas, Shiva, Jáh Buda, Kwan in, todo a Tribo da Cura espiritual em movimento. Amém, Shalom, Axé, Haux Haux!!! 

Uma só Nação, na Terra e no Astral, para auxiliar, ajudar, fazer a parte humana e espiritual nessa tragédia para que a água abaixe e a terra, o chão, os terreiros voltem a ser seguros para que as crianças possam brincar de Grêmio X Internacional novamente com suas bolas e brinquedos enviados pelos Erês, Curumins que vem doar alegria e esperança com seu Axé Macumbeiro e suas cartinhas:

" Olá, meu nome é Maria Eduarda, tenho 10 anos e moro no Mato Grosso. Quando ouvi a história a história do alagamento eu me comovi muito e decidi ajudar e mandar um saco cheio de roupas, brinquedos etc. Espero do fundo da minha alma que vocês fiquem bem.

Toda noite eu oro por vocês, que Deus abençoe vocês. Amém!

OBS: espero que as crianças gostem dos brinquedos porque eu os amo muito, principalmente os ursinhos iguais."

Salve a Ibejada
Salve a Marujada

Somos todos Um
Matnis

Professor Frank Oliveira

domingo, maio 05, 2024

livre


Liberdade, Liberdade é Reconhecer que há tempo de aprender e tempo de ensinar

Arlequim e a Liberdade


Foi na floresta que Arlequim, antes de voltar para a cidade e para a sua missão de ensinar o que sabia e encantar a todos, encontrou uma mulher negra que colhia folhas e frutas, ela se aproximou do nosso Palhaço Cósmico e lhe ofereceu uma maçã. Nosso Arlequim ficou um pouco receoso de aceitar. Maçãs sendo entregues em uma floresta sempre renderam alguns problemas nos contos de fada, mas ali era a vida real e ele estava faminto.

- Obrigado! – disse ele e recebeu a maçã.

- Achei que não aceitaria. Afinal, maçãs sendo entregues por mulheres em florestas encantadas sempre acabam mal nos contos de fada. – disse ela

-Bom, eu estou com fome e a senhora está me oferecendo alimento.  Se quisesse me fazer mal, já teria feito e sinto que a conheço. Quase posso lembrar onde e como, mas a memória está turva.

- Essa é a maçã da Árvore da Vida, quem comer dessa maçã, vai ter acesso ao conhecimento do mundo e o dever de compartilhar. E você está pronto, Arlequim, para finalizar esse etapa da sua jornada e começar outra. Quando nos encontramos, a primeira vez, você era aluno, agora, se tornou um Professor. E sente que há tempo de aprender e tempo de ensinar. Sua Espada tem a minha benção.

- Akiro Obá Yê!!! – disse Arlequim, reconhecendo a Mãe do Conhecimento – Eu lembro...

- Sim! Siga seu caminho e honre o seu lembrar, sempre afiando sua Espada no Amor. Não tenha pressa de nada, mas mantenha-se constante em tudo. Você já provou da Maçã da Árvore da Ilusão e precisou esquecer. Agora você é merecedor das lições da Serpente do Amor. 

- A Serpente do Amor?

- Alguns chamam de Kundalini, outros de Serpente Emplumada, mas na sua linhagem, ela se apresenta como a Serpente do Amor, que é outro nome para meu irmão: Oxumaré.

Nesse momento, um arco-íris surgiu no céu.

- Vá Arlequim, Oxumaré está te esperando...basta seguir as setas douradas indicando o caminho para o fim do arco-íris. 

- Sou muito grato, Obá!

- Seja grato e trabalhe para se manter afastado da Árvore da Ilusão. Que Olorum te abençoe e que Oxumaré te guie com as suas palavras.

*SERPENTE ENCANTADA*

Conta a lenda que a Serpente Encantada
Tinha todas as palavras que eu queria aprender
 
E eu queria aprender todas as palavras
Que a Serpente me mostrava, pois eu desejava ser
 
E nesse tempo que eu ficava desejando
A Serpente foi mostrando
Tudo o que eu podia ver
 
E eu fui vendo as cores do Arco-íris
Cada cor uma palavra
Cada palavra uma cor
 
E cada cor me revelava um segredo
E eu fui perdendo o medo da Serpente do Amor

Arlequim e o Amor


Pouco a pouco, Arlequim começou a sentir *Amor* por sua Espada. Onde quer que ele fosse, sempre surgia alguém que precisava escutar alguma *palavra bonita*. Arlequim sentia que o mundo precisava mais e mais de palavras bonitas que pudesse levar a todos ao Sentir e por causa disso e por ajudar tanta gente com as suas palavras, Arlequim começou a perceber que quanto mais ele oferecia, mas surgiam pessoas dispostas a receber, porém, com isso, veio também um problema, pequenos grupos se tornaram multidões e as perguntas sobre as coisas práticas da vida foram virando perguntas existências sobre o Segredo da Vida, o que há no Além e tantas outras coisas que pertenciam ao Reino da Religião. 

- Destino existe?

- Deus existe?

- Como posso enriquecer?

- Você pode me curar?

Arlequim sabia que ele havia cruzado uma fronteira perigosa do *Reino das Espadas* e quanto mais tentava explicar que destino é a gente que faz, ele começou a perceber que tudo que falava passou a ser distorcido para o que as pessoas queriam ouvir. Logo, surgiu seguidores que queriam transformar as palavras do nosso Palhaço Cósmico em uma espécie de religião, culto, crença. 

- Precisamos copilar suas palavras em um livro sagrado, Senhor Arlequim – propôs um

- Seu conhecimento é muito rico para não ser compartilhado com o mundo – dizia outro

- O Senhor precisa de um lugar para que as pessoas possam frequentar para ouvir o Senhor. Não se preocupe com o custo, basta cada pessoa pagar um pouquinho e podemos manter o lugar – dizia outro que o lembrava um certo Oposto.

E vendo o povo tão confuso, dependente, e querendo o colocar num pedestal religioso, Arlequim fugiu da cidade e voltou para a floresta. Queria ficar sozinho e avaliar se estava usando bem a sua Espada, mas chegando lá encontrou um homem e ele sabia que era o Oposto vindo lhe visitar novamente.

- Olá Arlequim, eu sou o Deputado Mutema. Vim lhe fazer uma proposta. – disse ele.

- Sim – disse Arlequim, achando quase ridículo o fato que ele reconhecia o Oposto como ninguém – Mas me diga, Oposto, por que você perde tanto tempo comigo?

- Bom, eu não sei por que você está me chamando de Oposto, eu sou apenas um representante do povo e acredito que você poderá ajudar muito mais toda essa gente na política. Basta assinar esse documento e se filiar ao partido e vamos cuidar de toda a campanha para você.

- Não! – respondeu Arlequim.

- Mas pense no alcance da sua arte, como deputado, você poderá...

- Não!

- Mas...

- Não!

- Entendo, então você acha melhor guardar todo esse conhecimento só para você? Isso é egoísmo. Todo dom merece ser compartilhado...

- Tenho amor as palavras, tenho amor ao aprender e ao ensinar, mas eu não sou Guru, eu não sou Político...

- Você poderia atingir multidões...

- Caro Oposto, basta apenas uma pessoa. Se minhas palavras puderem ajudar uma só pessoa, terei ajudado o mundo todo. Essa é a Força do Amor. O amor não se preocupa com quantidade, o Amor se chegar a uma pessoa – basta! Que minhas palavras cheguem aonde elas quiserem se apresentar.   

- Essas pessoas vão distorcer suas palavras e vão querer te crucificar. Isso é o que ocorre com quem possui essa Espada que você tem em mãos.

- Não posso me preocupar com o que ainda não ocorreu, mas posso te afirmar, é que ainda estou aprendendo, sei que vou errar, mas o Amor que tenho pela minha Espada vai me ensinar a me tornar o que acredito estar se apresentando. 

- O que está se apresentando?

- Eu sou e sempre fui um Professor!

Pobre Criatura

*Ninguém pertence a Ninguém*

Que insanidade é essa em darmos poder a outra pessoa em controlar o que se pensa, o que se fala, o que se sente.

"_Todas as cartas de amor são ridículas_"
Fernando Pessoa

Ainda estamos à anos luz de aprendermos a amar alguém de verdade, pois amar é acima de tudo, respeitar a individualidade do outro que nos atraiu no início de tudo. Mas em algum momento, esse amor se distorce, e a união se torna possessão. Daí, ficamos tão preocupados em perder aquele/a que nos pertence, que a gente passa a desconfiar, que a qualquer momento, alguém ou algo vai nos tirar nossa posse.

Ora, não é sobre confiar no outro, é sobre confiar na gente. Quem confia em si mesmo sabe se a relação que tem é um ninho ou se é uma arapuca. Se for ninho, todos os dois são livres pra ficar ou partir, se é arapuca, os jogos mentais, o ciúme, as brigas passam a ser mais constantes e o tóxico toma de conta.

Não há Espada que possa cortar essas correntes, mas a Espada pode mostrar a direção de quem deseja se libertar dessa prisão. 

E a Espada do nosso Arlequim avisa tanto a Columbina quanto a Pierrot: *Onde foi parar o amor próprio*? 

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Arlequim e a Paz


Pierrot e Columbina estavam namorando há algum tempo. Pierrot era o melhor amigo de Arlequim e como vocês sabem, Columbina era o grande amor de nosso Palhaço Cósmico, e justamente por amar tanto Columbina, Arlequim não sofria ao ver os dois juntos, mas o que o machucara mais era ver os dois brigando. 

Aquela relação era o que poderia ser chamada de tóxica, eles brigavam e ficavam juntos, ficavam juntos e brigavam e depois se reconciliavam. Era uma relação iô iô, de altos e baixos, mas não cabia ao nosso Palhaço Cósmico julgar, cada um no seu espaço e lugar. 

Mas naquele dia, ao jantar com os dois, Arlequim ficou num impasse. 

- Você mexeu no meu celular sem a minha permissão – acusava Pierrot.

- Eu sou sua namorada, e tenho direito de saber o que você está fazendo e com quem está conversando quando não está comigo – se defendia Columbina.

- Eu a amo, e sei que você me ama, mas isso não te dá o direito de mexer nas minhas coisas – disse Pierrot.

- Você está escondendo alguma coisa, se não estivesse, não teria se incomodado tanto – disse Columbina.

E a discussão continuou com acusações e defesas. Arlequim segurando a sua espada, só observava. Ele tinha a sua opinião, mas era a sua opinião, a sua “verdade”, e já tinha caminhado muito para saber que cada pessoa tem a sua verdade e opinião também. 

- O que você vai fazer além disso? Contratar alguém para me seguir? – Perguntou Pierrot.

- Eu não me rebaixaria tanto – disse Columbina – Mas se não podemos ter uma relação transparente, é melhor não ter relação alguma.

- Relação transparente é achar normal, alguém mexendo no seu celular, procurando motivos para justificar sua própria insegurança? – disse Pierrot.

- Ahhh... agora a culpada sou eu... – disse Columbina.

- Arlequim? – disse Pierrot – Você concorda com isso? Você acha que é normal, por estarmos juntos que Columbina mexa no meu celular e saiba tudo o que eu faço quando não estou com ela?

- Arlequim, você não acha que estou certa? Afinal, se estamos juntos, eu tenho que saber o que  ele está fazendo... – perguntou Columbina

E os dois olharam para o nosso Palhaço Cósmico, buscando a aprovação dele ou reprovação.

Arlequim olhou para os dois, respirou fundo e com a sua Espada firmada, falou...

Arlequim e a Verdade


Nosso Palhaço Cósmico carregava sua espada em suas costas, e volta e meia, ele a retirava e via refletido em sua lâmina, palavras que pareciam querer se soltar pelo ar, mas Arlequim sentia que ainda não era o momento de usar sua espada, ele queria que quando isso ocorresse fosse natural. Ele sabia que quando estamos preparados, quem precisa das nossas Espadas aparece.

Foi quando ele pensava nisso que nosso Palhaço Cósmico e encontrou A Musa da Verdade. 

- Salve suas forças, Arlequim. Vejo que você carrega a Espada das suas palavras. Está preparado para fazer o Juramento da Verdade?

- Juramento?

- Sim, somente dizer a Verdade. Se você fizer o juramento, sempre me terá do seu lado.

- Mas por que eu tenho que fazer esse juramento?

- Pois, para se comunicar com os outros, é preciso sempre dizer a verdade incondicionalmente.

- Bom... eu compreendo o que você está propondo, mas eu não faço alianças, juramentos com ninguém. Aprendi que promessas são cordas que te amarram em algo que foi Verdade um certo tempo, mas que não é mais... ninguém entra o mesmo em um rio...

- Duas vezes. Sim, essa é uma Verdade e se guiar pela Verdade vai ajudar você a usar bem a sua espada.

- Bem... eu agradeço a sua visita, mas eu não acredito em Verdade Absoluta.

- Por que não? Você prefere a mentira?

- Não prefiro a mentira, eu só acredito que a Verdade quando pode machucar alguém, deve ser evitada. Verdade sem Amor é crueldade.

- Você não acha que todos deveriam receber a Verdade em qualquer circunstância?

- Posso estar errado e estou sempre disposto a aprender, mas a Verdade a qualquer custo, pode ser bem cruel. Alivia a alma de quem fala, mas pode destruir quem a escuta.

- A Verdade é uma das maiores virtudes desse mundo, Arlequim. E se a sua espada for firmada na Verdade, você vai sempre empunhá-la com valor.

- Eu te agradeço, mas prefiro moldar o uso da minha Espada no Amor. Com Amor, jamais usarei a Verdade como arma de segundas intenções. Que cada pessoa descubra a sua Verdade quando estiverem prontas e não porque eu acho que elas devam saber. Eu acredito na Liberdade dos pensamentos e juízos de cada um. Não há soluções fáceis para problemas complexos. Usar a Verdade como baliza deve ser nosso objetivo, mas usar a Verdade como moeda de troca, diz mais sobre você do que sobre a pessoa que você quer "ajudar" a ver a Verdade.

- Percebo que você tem sua própria crença sobre a Verdade.

- Todos possuem sua própria maneira de ser Verdadeiro. Impor sua Verdade ao outro pode ser uma violência e minha Espada, embora seja banhada da minha Verdade, jamais será usada para ferir alguém com o que eu acredito que a outra pessoa deve saber. Eu não sei o que é melhor para o outro, só sei o que é melhor para mim e é melhor para mim, empunhar minha Espada com Amor.

Arlequim e O Reino de Espadas


Arlequim viajou, caminhou, ora como caminhou, e observou, estudou, sentiu, e depois de tanto saber, descansou, aprendeu a parar, descansar, silenciar e apreciar. Ele apreciou e deixou tudo aquilo que ele desejava entrar e moldar suas Copas, seus Paus, seus Ouros e depois de girar e regirar o mundo, ele retornou ao seu eixo, seus pilares, sua base, seus valores, ele se viu novamente na encruzilhada de seu compadre Exu, mas dessa vez quem estava lá era uma mulher, vestindo roupas que pareciam trapos coloridos, a moça era linda e carregava em seu cabelo, uma rosa vermelha. Ela sentava no trono de Exu, no meio da encruzilhada e bebia champanhe em uma taça cristalina e fumava uma cigarrilha, cujo fumaça formava uma espiral para baixo. 

- Eu estava te esperando, Arlequim - disse ela com uma voz que lembrava um leve sotaque espanhol. 

- Eu sinto que eu conheço a Senhora há muito tempo - disse nosso Palhaço Cósmico.

- Eu estive em todas as mulheres que estiveram com você, querido Artista do Saber; estava na sua Mãe quando te pariu, estava em Colombina quando você se apaixonou, estive com cada uma das mulheres que você ensinou e no prazer que você teve com todas as mulheres com quem se deitou, e estarei em suas filhas e netas e todas as mulheres que te ensinarão sobre o feminino. Sou o lixo, sou o trapo, sou o riso, sou a dor, sou a Senhora das Graças do Palácio Dourado e a Nossa Senhora das Ruas escuras, estou em cada menina, mulher, idosa no mundo, e sigo sendo e andando na delicadeza da flor, sou Maria Mulambo.

- Laroyê, Pombo Gira

- Mojubá, meu homem, meu menino, meu velho. Meu Irmão, meu Amante, meu Amor, meu Inimigo, meu Grande Amigo, nunca Desconhecido. Preciso te dizer por que você está aqui?

- Não, minha querida Guardiã, eu vim pois minha alma assim quis, meu espírito só guiou esse veículo que visto para receber a minha espada e a Senhora veio me dar a permissão de voltar a usar a minha Espada.

- Sua Espada está ali, encravada na Rocha, aguardando suas mãos...

- Sinto, mas não preciso mais retirar ela da Rocha, agora sei que minha Espada não precisa cortar o ar do outro, para se fazer respirar no entendimento do que comunico. Lembro agora porque Obá me deixou lembrar e recordar o quanto curei e o quanto fiz sofrer com as espadas que empunhei. Sei e sinto. Mas não acredito que precise empunhar mais essa Espada.

- Sinto e Sei o quanto você se transformou para poder aqui estar. Mas por que ainda teme empunhar sua Espada?
 
- Só agradeço, minha Senhora, não temos. Sinto que não preciso mais escolher um caminho ou outro dessa encruzilhada. Todos os caminhos levam para o mesmo lugar: a mim. Não é suficiente o meu Sentir, por que ainda precisaria de Espadas? Se eu preciso, Senhora, a empunharei, mas antes, me permita perguntar: por quê?

Maria Mulambo gargalhou, não de escárnio, mas de surpresa pela coragem do nosso Palhaço Cósmico em admitir que estava diante do oculto, de algo novo que, mesmo com toda a sua bagagem, mesmo com toda a sua experiência, ele precisava aprender...

- Quem eu sou?

- A Guardiã do Saber que eu entrego ao mundo.

- Sabe tudo sobre mim? 

- Muito pouco, nunca saberei tudo, mas Sinto o suficiente para perceber que desejo aprender o que a Senhora quer me ensinar agora.

- Nenhuma mulher é igual a outra, Arlequim, assim como nem um saber é o mesmo. Eu sou Mistério do Feminino, sou a Vulva, sou a Mãe Vagina, sou Ìyámàpò, sou reta, sou turva, sou a familiaridade de onde saem todos os filhos, e o oculto que os Homens querem tanto conquistar, mas nunca saberão tudo. Eu sou O prazer, sou óbo, sou inú, sou O segredo da criação, sou todas as amapôs, as espadas entram em mim, mas sou eu quem as devoro. Se sua espada for amor, terás o meu carinho, se sua espada for para a dor, a castrarei com meus dentes e espinhos. Eu sou O desconhecido dos Seres que buscam o Caminho do Meio entre o se erguer externo do Masculino e o ceder fluindo do Feminino. Eu sou apenas um lembrete, uma seta para te indicar que a Mãe Divina é Parvati, mas também é Kali, e quanto maior é a consciência de um Ser Humano, maior é a queda se ele se esquecer que o Pai Sol é poderoso e nos move, mas é a Mãe Divina e sua Yoni que germinam pelo mundo seu maior fruto: a vida! E a Vida é sempre um rio onde você não entra o mesmo, uma segunda vez, pois ou mudou ou o rio... - disse a Guardiã, olhando para Arlequim, esperando que ele completasse a frase.

- Ou mudou a gente de vez - disse Nosso Palhaço ...

Arlequim olhou a garrafa de champanhe ao lado do trono e perguntou:

- Posso lhe servir mais um pouco de sua bebida?

- Sempre, mas só se você também tomar um golinho antes de seguir a sua viagem.

Arlequim o fez, serviu a Pombo Gira e depois, recebeu a taça de suas mãos e bebeu.

- Matnis, Arlequim 

- Matnis, minha Senhora.

- Essa bebida que recebeu, é sua Medicina das Espadas, Arlequim. Vai te ajudar a sempre sentir suas Espadas, antes de usá-las. Bem intencionadas com o seu coração, serão uma benção, farão bem a todos que a tomarem, mas se forem recheadas de segundas intenções, serão O Veneno das Maldições de tudo aquilo que não foi dito direito. Cada palavra que sair da sua boca tem o mesmo poder dessa bebida: medicina e veneno? Sinta qual a dose e você sempre estará conosco ao seu lado e ao seu favor... agora, deixe de frescura e retire sua Espada da rocha. No mundo onde ela se faz necessária, palavras são veículos para o seu Matnis. Segure a sua Espada com a delicadeza, respeito e firmeza que segurou a minha taça.

Arlequim se aproximou da rocha e segurou sua espada e disse em voz alta:
- Eu sou *Merecedor*!!!

quinta-feira, maio 02, 2024

A Lição do Mosquito


Não sei quando nem como, mas quis a Natureza e o Mosquito que eu adoecesse, parasse, e a doença chegou como um raio de uma tempestade que não vi chegar, cujo trovão da dengue me silenciou? Silenciou???

Calei e tomei do cálice das dores que aflige nosso povo e sofri com todos.

Ao sofrer as dores dessa doença, outra de tantas que aflige nosso país, me uni as crianças que lotam nossos hospitais públicos, pedi ao Pai Omulu que ninguém mais  sofresse com aquele mal. Rezo humilde de quem não deseja esse malefício ao seu pior inimigo e confesso, sem orgulho, que aos 50, não posso mais me orgulhar de não ter desafetos - todos o temos - mas sou Pisciano, só quero o bem até a quem não quer me ver bem. 

Mas perceba, não escrevo essas linhas para que os leitores se compadeçam de meus espinhos (Aprendi que os amigos se afastam de gente enferma), mas para exercer minha arte de escrever e compartilhar tudo aquilo que sinto e sinto essa doença falando comigo, quase se desculpando por me deixar tão aflito e temeroso... sim, esse mal do Mosquito pode matar e amo viver, daí, quando a gente passa de fininho, e fica bem pertinho de tomar chá com a Senhora das Calungas, a gente percebe o quanto tudo que não é saúde, tem um tantão de ridículo.

Tudo que não é saúde, deveria ser uma nota de rodapé e não manchete nos jornais da nossa vida.

O que os outros pensam,
O que dizem da gente,
As expectativas que temos em relação a vida,
Nossos "grandes problemas",
E tudo aquilo que nos tira o sono e tranquilidade e alegria 
Deveria ser apenas letrinhas pequeninas nos nossos livros 
E não assuntos de capítulos inteiros.
Afinal, no Livro da Vida,
A Saúde é muito mais importante que dinheiro, amor e sucesso.

Mas só sabe disso
Quem Sente esse gostinho de ... dói tanto, dói tudo
Até viver...

Mas a vida...
A Vida sempre volta, e  o Mosquito já deixou o seu recado 
E essa doença que vai marcar o ano de 2024, pelo menos na minha vida,
Vai passar.
Tudo passa,
Só não passa a vontade de compartilhar o que Sinto,
E o que eu Sinto nesse momento 
É

- Você aí que não está doente... te lembra: não precisa adoecer para ser grato por sua saúde e vida!!!!

Eu???

Eu estou grato pela saúde que está voltando e pelo resto da minha vida que vai receber alguém mais alegre e feliz por apenas Sentir e Ser.

Ser e Sentir.
E é claro... compartilhar ...

A Natureza do Mosquito é picar, a minha é te contar, compartilhar...tudo que passei, passo e passarei... passarinhando no meu viver.

Gratidão
Obrigado
Valeu

Por você me ouvir,
Me ler
Me Sentir.

*Matnis*

sexta-feira, abril 19, 2024

Arlequim e a Luz



Arlequim encontrou o Professô nos degraus da Catedral de Cusco, no Peru. Aquela Catedral ja tinha sido um Templo Inca que havia sido transformado numa Igreja Católica pelos espanhóis. O Curioso era que a estrutura de cima era espanhola barroca, mas as bases eram as pedras firmes das construções Inca.

O Professô estava sentado com seu chapéu branco e seu livrinho de anotações e Nosso Palhaço Cósmico se aproximou e sentou ao seu lado. Não era a primeira vez que o Professô encontrava o Arlequim, mas o Arlequim não se lembrava do Professô, embora tivesse conversado com ele, uma última vez numa caverna há Paus e Copas atrás. Aquele dia era o dia do *Rei Sol:Taita Inti* e todo o país estava em festa, numa mistura entre os símbolos cristãos e incas, típica da evolução das Espadas na mente humana.
- O Senhor sabe o que eles estão festejando aqui? - perguntou Arlequim.
- É uma festa da Fé e da Luz que concilia o que se foi e o que ficou nessa mistura colorida linda da Vida - respondeu o Professô.
- Eu sei pouco - disse o Arlequim - mas esse povo foi dominado pelos espanhóis, sua fé foi transformada e quase excluída, os dominadores levaram todo a riqueza daqui e só deixaram pobreza e eles ainda estão celebrando... de onde eles tiram essa força para transformar *dor em arte*? 
- Da Fé que eles possuem em Taita Inti: o Pai Sol desse povo.
- Taita Inti?
- Sim, O Pai Sol ( *Luz*) se unia com a Mãe Terra ( *Fé*) Pacha Mama e as sementes (*Filhos da Fé e da Luz*) poderiam germinar e florescer nessas terras, trazendo alimento para todos. A conversão Cristã não conseguiu excluir nem a Fé, nem a Luz do povo Inca que aí estão, celebrando seu *Dia do Sol*.
- É um milagre, não? Manter a Fé e a Luz quando estamos na dor.
- O coração é celebração, Arlequim, não cabe na escravidão e na dor. Quando o *coração se expreme de tanta dor*, o milagre ocorre e você entende que *o grande vencedor se ergue com a dor* e mesmo diante da crueldade e *as perdas* que, às vezes, sombreia nossa dimensão, o coração opera o milagre de *continuar a ter fé*. 
- Acho que vou me juntar ao cortejo, Senhor, depois da estória que o Senhor contou, me vi na obrigação de celebrar junto a esse povo.
- Vai, Arlequim, mas não se esquece. Quem se reconhece *Filho do Sol*, só tem uma única obrigação...
- E qual é?
- *Brilhar*

Arlequim e o Ensinar


Entre o Cerrado e Caatinga, a Rosa dos Ventos se movia e Arlequim viajava. Ele gostava de caminhar pelos 4 cantos, sentir paisagens, falar com as pessoas e se conectar com tudo e todos. Viajante, ele se sentia um só com o caminho, peregrino do dia, romeiro da noite, ele não sabia se gostava mais do sol refletindo no rosto das pessoas ou a noite revelando os segredos ocultos. Entre uma curva e outras chapadas, entre o Viadeiros e Diamantina, foi entre o Goiás e a Bahia, que ele encontrou o *Impostor*. 

Lá estava o nosso Arlequim ensinando um menino a montar uma pipa, e onde quer que ele ia, surgia alguém querendo aprender algo que ele sabia ensinar. Ele não precisava montar uma escola ou uma barraca, pois era como se ele próprio fosse a sua Sala de Aula. Sentia que quem precisava aprender com ele, simplesmente aparecia, não era sorte, era a *sincronicidade* entre oferecer algo que o mundo precisa. E foi assim, que nosso Arlequim percebia que não precisava oferecer, bastava estar disponível para ofertar, e *eles e elas*  vinham. Afinal, se havia algo que ele tinha aprendido é que há mais gente faminta e sedenta de saber do que gente disposta a ofertar o que sabe. E foi ensinando uma senhora sobre um rezo alegre com ervas que sabia que era bom para curar língua de quem fala mal dos outros, que ele sentiu um redemoinho se aproximando na rua deserta. A senhora se afastou, pois gente antiga sabe que "moinho é rede do demo", mas Arlequim que já não fugia mais desses encontros, reconheceu quem estava dentro do redemoinho, e saudou o seu *Oposto*, que rodopiava ao vento disfarçado de Iansã. 

- Não vai saudar a sua Mãe dos Ventos? - disse o Impostor

Arlequim se inclinou em saudação, mas não era em reverência a Oyá - Eparrei! - ele fez sua saudação de respeito com o seu *mudra* de proteção ao mesmo tempo. 

- Saúdo e respeito a sua existência nesse Mundo Dual, Senhor Impostor.

O Oposto percebendo que não enganava nosso Palhaço Cósmico, retornou a sua forma original, que era uma imagem que mudava de forma de acordo com as palavras que dizia.

- Ahhh... estava só brincando para saber se você acreditava ...

Arlequim não riu, mas também não fez cara de confronto, sabia e sentia que o Oposto era professor, mesmo que usasse uma didática distorcida.

- A que devo a honra da sua presença? - Perguntou 

- Estava te observando ensinando esse povo e decidi trocar umas palavrinhas com o amigo, mas deixa eu te fazer uma pergunta: Você é professor? Porque você sabe para ensinar é preciso ter diploma, ensino superior, permissão e carimbo autorizando, não é não?

- Eu sou o Arlequim e você é o Oposto. Somos o que Somos. Eu ofereço quem sou e você oferece o que É, e o mundo recebe o que ofertamos, se isso será aprendizado ou atraso na caminhada de quem recebe, não cabe a nós decidir ou julgar, não é assim?

- Sinto que você esta mudado, Caro Palhaço, desde o nosso último encontro, houve aí dentro de você, umas transformações, não é não?

- Ninguém entra no mesmo rio, do mesmo jeito, uma segunda vez, não é assim?

- Ou a gente muda ou o rio muda, não é não?

- É assim, não?

- Mas você sabe, Arlequim, que você ainda tem muito chão para caminhar antes de se tornar um professor, não acha que esta ensinando antes do tempo? Não acha que é preciso ter mais experiência para ter certeza absoluta que não esta fazendo bobagem? Muita gente por aí, não consegue ensinar sem ter segundas intenções. Muita gente por aí, ensina por ego, oferecendo pão para colher água...não é não?

- Recebo suas espadas, Caro Oposto, mas me responda, Oyá, Eparrei Minha Mãe, deixa de ventar?

- Claro que não! 

- Ajudar quem precisa é meu Ventar, deixar de ajudar é ir contra a minha Natureza, assim como seria contra a sua Natureza, nos ensinar com a luz, quando a sua escuridão ainda é o que o mundo precisa receber, não é assim? 

- Você esta dizendo que quero te sombrear, Palhaço? Porque se sim, você esta enganado, eu sou apenas um amigo proseando, não é não?

- E recebo a sua prosa com respeito e carinho. Reconheço a sua importância e lhe agradeço, Caro Oposto.

- Bom... a conversa esta boa, mas preciso seguir meu caminho, Arlequim, mas deixo aqui meu conselho, reflita e sinta se o seu Ensinar é mesmo o que há abundante em sua... como você diz mesmo? ... dispensa.

- Aceito, recebo e sinto o seu conselho, Caro Oposto, até o nosso próximo encontro. 

- inté... "Professor Arlequim!" - disse o Oposto com sarcasmo, e sua imagem virou a forma de um Carcará, batendo suas asas e voando para longe. 

E antes mesmo que Arlequim pudesse refletir sobre as lições daquele encontro, um turista com um mapa na mão, com cara de quem estava perdido se aproximou e perguntou:

- Do you speak English, Sir? I am kind of lost...

- Yes! - respondeu Arlequim - How can I help you?

E lá seguiu nosso Arlequim com o seu Ensinar, enquanto o vento da Verdadeira Oyá trazia alívio aos corpos que se moviam naquele sertão.

*Matnis*
Eparrei!

Arlequim e a Neutralidade


Tic Tac
Tic Tac

Arlequim estava sentindo uma pressa, algo que parecia vir de seu Reino de Copas, mas ele havia aprendido a não excluir nenhum Sentir, observou e deixou a pressa falar, a pressa nada dizia, falava apenas pressa: tic, tac, tic, tac!

Enquanto os ponteiros do relógio cantavam, ele foi convidado por Colombina e Pierrot para um jantar. Arlequim adorava estar com seus amigos e jantar e falar sobre nada e rir, era o melhor ritual que se pode ter com quem se ama. Porém, quando Copas vira Paus nesse mundo dual, as conversas ficam mais racionais, mais acaloradas e mais destinadas a uma construção de realidade palpável e objetiva, e a pressa de Arlequim começava a afetar o seu se relacionar, pois ele notou o quanto Colombina e Pierrot eram tão diferentes: Colombina era Yang, solar, expansiva e explodia em ideias – Pierrot era Yin, lunar, introspectivo e queria guardar tudo só para si, mas os dois pareciam ter mil conselhos em ajudar Arlequim em desenvolver os seus Ouros do seu Servir. Tic Tac Tic Tac Tic Tac…

- Você deveria ser um cantor, Arlequim, compor, fazer música para o mundo. Você tem esse dom de criar e vai ser muito próspero fazendo isso – dizia Colombina.

- Você deveria ser um escritor, meu amigo Palhaço, você escreve tão bem e conta estórias como ninguém, e escrevendo, você nem precisa se expor, pode permanecer nos bastidores e prosperar – dizia Pierrot.

Tic Tac Tic Tac Tic Tac

- Você é Rock and Rolll – dizia Colombina

- Não, ele é mais Jazz – defendia Pierrot

- O que você acha? – perguntaram os dois...

Tic Tac Tic Tac Tic Tac

- Eu vou lavar os pratos! – Respondeu Arlequim, deixando os dois discutindo sobre a vida e os rumos do Servir do Palhaço.

E lá estava Arlequim, limpando os Paus, lavando com as Copas, enquanto a limpeza dos pratos, revelava mais uma vez os seus Ouros. E quando tudo estava limpo, seco e colocado em seu devido lugar, Arlequim sentiu o Silêncio tomar de conta...

TAO!!!

Arlequim se sentiu tomado pela força da organização, do silêncio e da temperança. O Tic Tac se tornara o Tao, e o silêncio tinha o som da *NEUTRALIDADE*. 

A neutralidade do TAO conversava com nosso Palhaço Cósmico no silêncio e o dizia que ele já sabia tudo que precisava saber, tudo que precisava fazer. Lá nos bastidores, Obá sorria... Ele lembrava que a sua vida dedicada ao Servir não era em vão e para que seu Servir pudesse ajudar o mundo e lhe trazer todos os recursos que ele precisava para se nutrir e se manter, ele apenas precisava se afastar do Tic Tac e deixar o Tao prevalecer.

Na Neutralidade, ele não se confundia com as Copas, nem com os Paus.

Na Neutralidade, ele não seguiria nem o Tic nem o Tac, mas compreenderia que a soma dos dois, o levava ao Tao que tudo tem e nada possui ao mesmo tempo.

O Tao lhe mostrava que a prosperidade não era sobre *TER*, mas *MANTER* o que já possuímos naturalmente e isso se refletiria naturalmente na sua *DISPENSA* que sempre estava abundante porque o Universo *não mantem dispensas vazias* de quem *TEM A CORAGEM* de servir aquilo que transborda e o AMOR SEMPRE TRANSBORDA.

Arlequim sabia que seus Ouros transbordavam porque a *FONTE ORIGINAL* (ora iê iê, Mamãe) nunca deixa de fluir para quem serve o seu melhor.

Então o TAO voltou a ser Tic Tac, o relógio começou a correr novamente e com ele, Colombina e Pierrot, o Mundo que o esperava e a *AÇÃO* (que é matéria prima e rica do *REINO DE OUROS*) o convidava para agir, entre erros e acertos, acertos e erros, mas para colocar o seu Servir em movimento. 
Essa era a sua arte. 
Isso é o seu *Matnis*.

Arlequim e o Servir


Arlequim queria fazer alguma coisa pelo mundo e por todas as pessoas. Já havia aprendido tanto sobre Gandhi, Madre Tereza, o Homem-Aranha e Ailton Krenak e resolveu sair para as ruas e montou uma barraca, na Praça da Sé, para dar carinho e afeto ao povo que morava na rua. 

"Barraca do Abraço" estava escrito na cartaz de sua tenda e ele se preparou para   abraçar quem desejasse o seu *Servir*, mas ninguém se aproximou. 

E olha que nosso Palhaço Cósmico era uma figura chamativa, e mesmo com suas roupas e barraca colorida, ele continuava a ser ignorado por todos, mas ele não desistiu. Retornou no segundo dia, no terceiro e no décimo, mas o resultado era o mesmo: *invisibilidade*.

Quando ele já pensara em desistir, ele percebeu que havia uma outra barraca em que o povo que vivia nas ruas fazia fila, era a *Barraca de Pantalone*, um antigo conhecido de Arlequim, que tinha uma loja onde vendia de tudo - a preços um tanto abusivos - Pierrot e Columbina detestavam comprar lá também, mas para a surpresa de Arlequim, Pantalone estava fazendo um enorme sucesso e parecia ter mudado, pois ele distribuia Pão para as pessoas de graça. 

Arlequim foi até a barraca do comerciante e o observou e depois que ele já tinha distribuído seus pães e se preparava para ir embora, Arlequim foi até o homem e perguntou:

- Senhor Pantalone, vejo que sua barraca de pão faz um enorme sucesso. Parabéns! 

- Obrigado, Arlequim, mas vejo que sua barraca é um fracasso. Sinto muito por isso.

- Bom, abraços é só o que consigo oferecer nesse momento, Senhor Pantalone, mas que bom que o senhor pode oferecer a todos esses necessitados, os seus pãezinhos. Sua alma é generosa. 

- Sim, Palhaço, eu sou um homem bom, mas não sou bobo. Está vendo ali, no outro canto da praça?

Arlequim olhou e viu uma *Barraca de Água* com uma fila enorme de pessoas. 

- Sim, mas aquela barraca cobra pela água.

- Mas é claro! Aquela barraca também é minha. Ninguém come só pão, não é? - disse Pantalone com um sorriso malicioso - e com o preço da água nos dias de hoje...Ahhh tem sido um bom negócio ajudar as pessoas.

- Entendo...

- Entende nada! Você quer um conselho? É de graça...

- Obrigado, mas não...

- Então, para sua Barraca do Abraço fazer sucesso, chame um amigo para montar ao lado da sua, uma outra barraca, a *Barraca da Humilhação*, assim todo mundo que for humilhado pelo seu amigo, vai com certeza, correr para a sua barraca depois. A Humilhação e a mendicância por carinho e atenção são grandes aliadas.

Arlequim agradeceu o conselho que não tinha pedido e foi desmontar sua barraca, refletindo que não era assim que ele queria servir ao mundo.
Quando ele já se preparava para ir embora, um senhor se aproximou e perguntou:

- É aqui que se distribui abraço?...

Arlequim e o Animal de Poder


A Casa de Arlequim tinha dois andares. Na parte de baixo, havia os cômodos em que ele recebia seus amigos e familiares e na parte de cima, todos os quartos aonde ele acomodava seus convidados e suas lições de vida.

Era lá que havia o quarto onde morava a *Noite Escura da Sua Alma* com todas as lições do Reino de Paus e o quarto onde morava o *Dia Claro da Vida*.  Naquela manhã, ele decidiu entrar nesse quarto,  mas antes que entrasse, ele notou que um gatinho saiu de lá.

Era um gatinho amarelo que ronronava e se aninhava em suas pernas, talvez buscando carinho, talvez querendo comida.

Arlequim lembrou que não tinha comida de gato em casa, e tratou de ir até a mercearia para comprar e tão logo retornou para casa para alimentar o bichinho, notou que o gatinho havia se transformado em uma onça que parecia rugir em sua sala de estar.

Com medo e receio que a Onça o devorasse, Arlequim correu para o quarto da *Zona de Conforto*, tentando entender como o gatinho tinha virado uma onça, deixando-a esturrando ameaçadora na sala.

Então, ele lembrou que tinha marcado um café com Colombina e Pierrot e eles estavam para chegar mas a Onça na sala, o impedia de sair e seus amigos não poderiam entrar.

Nosso Palhaço Cósmico tentou até sair pela janela, mas a janela da Zona de Conforto estava emperrada devido a toda a sujeira da procrastinação que se acumulou.

O que Arlequim faria? Como ele escaparia dali? Quebraria a janela? Enfrentaria a Onça?

Então, Arlequim olhou para cada uma de vocês que liam sua história e pediu ajuda, perguntando:

- E agora? O que eu faço?

Arlequim e o Reino de Ouros


Um certo dia, Arlequim cuidava do seu jardim, removendo os últimos paus, galhos secos e ervas daninhas e notou que algo brilhava na terra. Curioso, ele cavou e descobriu que algumas sementes que plantara estavam brotando ouro. 

- É ouro - ele exclamou - Estou rico.

À medida que enchia seu balde e cantava com alegria,  já pensando em tudo o que ele compraria e faria com toda aquela riqueza, o Sol que brilhava rico de luz dourada começou a ser coberto por uma sombra que não era das nuvens, pois o céu estava limpo naquele dia. E o dia claro foi ficando escuro e o ouro foi ficando cada vez mais cobre, quase chumbo. 

Naquele dia que mais parecia noite, Arlequim olhou para o tesouro que já não era tão valioso e ficou imaginando em tudo aquilo que ele havia perdido, antes mesmo de ter ganhado, daí, ele lembrou que havia outro tipo de Ouro que não dependia do dia ou da noite, do Sol ou da Lua, cujo valor era atemporal. O único problema era que aquele Ouro não pagava contas, não comprava posses e nem o traria aquisições, mas tinha o poder de lhe trazer mil aventuras. Aquele ouro eram as suas experiências, seus aprendizados que ele poderia compartilhar com o mundo e com todos.

E estranhamente, quando mais pensava em tudo que ele poderia fazer com aquele ouro interno, e imaginava todas as pessoas que se beneficiariam do seu tesouro, a sombra foi dando lugar para a luz, o Sol foi voltando a brilhar novamente e ele percebeu que quando o espírito  humano passa pelo Eclipse Total do Coração, o nosso corpo e mente se alquimiza e as intenções chumbos se tornam intento *OUROS*.

🔷🔶

Arlequim e o Perdão


A Rosa Azul era uma das rosas mais raras que existia na Terra, foi o que lhe disse a formiguinha que o ensinara tanto sobre a culpa. Disse a Formiguinha: " Ao encontrá-la, Arlequim conseguiria se libertar de vez da culpa que sentia por ter destruído o formigueiro por distração". 

Sim, nosso Arlequim ainda sentia os esporos da culpa, e mesmo depois de um dia inteiro de 8 segundos sendo formiga, nosso Palhaço Cósmico sabia que não poderia mentir para si mesmo e para as *Copas da Culpa* que ainda derrubavam a última lição do *Reino de Paus*. Ele ainda se sentia culpado, mesmo tendo ajudado tanto e ele havia prometido a Exu, que não mais escaparia de seu Karma e de nenhum item antigo ou novo de sua lista.

Ele então, respirou fundo, e se propôs a procurá-la. 

A Rosa Azul.

Juntou todas as suas ferramentas de *Mago*, pediu permissão a Omolu e Iemanjá e entrou nas Calungas da *Sacertotiza*, saudou Kali, Durga e Parvati, as *Imperatrizes* da Natureza, recebeu do *Imperador* Xangô, uma machadinha para cortar caminhos e na paz de Oxalá, o Grande Babá *Papa* da sabedoria, foi seguindo por cada Canto, Cada Arcano e quanto mais caminhava, menos sinal havia da Rosa Azul, e depois de cruzar com os *Enamorados* descaminhos, perder um certo controle sobre sua *Carruagem* corpo e ter dúvidas em sua mente se a *Justiça* lhe daria o privilégio de encontrar a Rosa Azul, o *Eremita* nele o lembrou que a *Roda da Vida* estava o levando, entre cada ferramenta do *Reino de Paus* a reconhecer o seu *Dharma* de ensinar e com a *Força* que ainda tinha, ele domou o cansaço da fera da preguiça e da procrastinação e parou de procurar a Flor Azul que a formiguinha lhe dizia que poderia lhe ajudar a limpar toda a culpa do seu Ser. 

E se percebeu *Pendurado* numa questão: "devo seguir ou devo parar de procurar uma cura para essa culpa?"
Daí, então, ali, enforcado em sua própria corda da culpa, ele entendeu que a formiguinha nunca disse que ele encontraria a Rosa Azul fora.

*Matnis*

Arlequim fechou os olhos e sentiu que para se livrar daquela culpa, ele teria que achar a Rosa Azul dentro dele mesmo. E foi dentro que ele sentiu, em alguma lugar entre o peito e seu plexo solar, havia algo brilhando, pedindo para ser reconhecido. 

Com carinho, Arlequim fui entrando em cada chacra, nadou em sua própria Aura, cruzou os canais dos Nádis e achou no não-movimento, entre as Montanhas do Silêncio, a Rosa Azul que procurava.

Quando a viu, sentiu sua beleza, e seu perfume conversou com ele, de um jeito que os doces aromas comunicam e tocam em todas as partes, incluindo a *Parte que Sabe*. 

_"Bem vindo, Arlequim_
_Eu sou a Rosa Azul do_ _Auto-perdão_

E se auto-perdoando, nosso Palhaço Cósmico recebeu a última ferramenta do *Reino de Paus*, sentiu o perdão, a clemência, a misericórdia e a piedade que achava que sentiria fora. E sentiu que se *perdoava*, *sentia muito*, e ele se *amava* o bastante para *se agradecer* por toda aquela jornada no Reino de Paus que o levara ao seu *crime*. 

Em suas mãos, a *Machadinha de Xangô* brilhava e refletia seu própria rosto.

" Não há crime, só há compaixão"
Kat Kabecilê

_Seja gentil. Be Kind com vocé_ disse a Rosa Azul. _Na delicadeza da lição das formiguinhas. Na sutileza de desejar se melhorar. Te lembra quem você é. Honra o que Obá lhe entregou. Fez algo que feriu alguém, reconheça, se desculpe, se auto-perdoe e, faça como as formiguinhas, prossiga._

E foi assim que o nosso Arlequim se perdoou e a *Copa da Culpa* se esvaziou por completo. Nosso Palhaço Cósmico estava pronto para o Próximo Ato de sua Jornada Sagrada. 

E a Rosa Azul era o Ouro que ele oferecia as *Glórias, Josies, Merys, Sandras, Denises, Anandas, Cristinas, Márcias, Anas, Milenas,  Ednas e Anes* que vibravam do outro lado por ele.

E o Arlequim disse, segurando sua Rosa Azul :
*Matnis*
🙏🏽

Arlequim e a Culpa

_A formiguinha corta folha e carrega_
_Quando uma corta, a outra pega_
_A formiguinha corta folha e carrega_
_Quando uma corta, a outra pega_


Arlequim caminhava por um parque, distraído, pensando amenidades, quando sem perceber pisou em um formigueiro. Assustado com o incidente, ele viu as formigas fugindo, e a bela construção destruída por seus pés, o que o deixou aflito e meio desesperado, se sentindo culpado por ter sido o pé que trouxe para aquelas formigas, tamanho desastre. O que fazer? Ele se perguntou. Não havia nada em seu Livro da Vida de Experiências que o preparasse para lidar com formigueiro destruído por seus pés.

Com certeza, ele já tinha pisado em formigas sem querer, mas dessa vez era diferente. Era como se ele sentisse a dor das formigas e ele se sentiu muito mal. Pensou em quanto tempo, elas tinham levado para construir a sua casa E ele em alguns segundos, havia destruído tudo completamente.

Uma parte sua tentava lhe convencer que aquela preocupação era bobagem. Ele era humano e tanta gente por aí, pisa em formiga, mata inseto e não se preocupa com isso, mas ele não conseguia evitar a culpa por ter feito aquilo. 

Arlequim se importava não apenas com os seres humanos, mas também com todos os seres vivos, e quanto mais tentava não pensar nas formigas, mas forte sua culpa aumentava. 
Como lidar com isso?
Você pode até achar uma bobagem, boa parte de vocês seguiria seu rumo, mas nosso Palhaço estava aprendendo a sentir os encontros e experiências que tinha no *Reino de Paus* e naquele momento, suas *Copas* o atravessavam, chicoteavam e por mais que ele tentasse se convencer que eram apenas formigas, a culpa retornava, mas algo estranho ocorreu...

Ele observou que as formigas tão logo que se espalhavam, fugindo da destruição de seu formigueiro, para não serem pisadas; retornaram para o local atingido, cada uma delas carregando um pedacinho de terra, barro sendo restituído e passaram a reconstruir seu lar destruído. E Arlequim foi percebendo, que tão logo o acidente tinha ocorrido - todas as formigas pareciam assumir algumas funções, umas reconstruíam, outras voltavam a pegar folhinhas, umas outras pareciam formar um pelotão para defender quem trabalhava de outros insetos e palhaços gigantes que destroem formigueiros e uma delas que parecia mais lhe chamar a atenção, permanecia imóvel e Arlequim poderia jurar, que ela estava olhando para ele e num desses momentos mágicos, que ocorrem entre um segundo e outro, algo extraordinário ocorreu. 
Arlequim não sabia se ele estava diminuindo ou se a formiga estava crescendo, mas ele se viu do mesmo tamanho que a formiga que o observava. E diante desse encontro tão estranho, nosso Palhaço Cósmico que já estava se acostumando com aqueles encontros surreais que surgiam em sua caminhada, apenas se abriu para um tipo de experiência e comunicação que surgia na sua mente.

- O que você faz aqui ainda, humano? Por que não segue seu caminho? – parecia dizer a formiga, mas o som não saia da boca da formiga, mas das antenas.

- Eu não sei ao certo, mas estou me sentindo muito culpado por ter destruído seu lar – disse Arlequim e o som que emitia, também não saia de sua boca, mas da sua mente.

- Não compreendemos o conceito de *“culpa”* que vocês possuem, humanos. Para nós, as formigas, não julgamos experiências como boas ou ruins, experiências são apenas experiências, quando uma de nós se perde ou não consegue realizar seu trabalho, todas nós somos afetadas, mas a formiga que se perde ou afetou o trabalho de todas as outras não se sente *“culpada”*, ela segue, nós seguimos adiante, prosseguimos. Sentimos que vocês fazem o contrário, quando algo ruim ocorre ou vocês provocam algo ruim ao seu outro, vocês param. Sinto que essa “culpa” que você diz ter, paralisa seu movimento e talvez, vocês possam parar suas vidas e gastar seu tempo com essa culpa, mas nosso tempo é diferente do humano, nossas vidas são curtas e *preciosas* e não temos esse tempo para perder e sentir essa culpa que os fazem parar. 

- E que se eu estivesse mais atento, prestasse mais atenção, eu não teria provocado esse mal a todas vocês...

- Não existe *“SE”* para as formigas, humano, mas sinto que você realmente se importa conosco, por isso, quero lhe propor algo: você aceita ser formiga por um dia e nos ajudar a reconstruir a nossa casa? 

Arlequim sorriu prontamente e concordou, mas a formiga lhe avisou:

- Há apenas uma condição. Se você quiser fazer isso, faça, mas não por essa culpa que você diz sentir. Sou apenas uma formiga, mas posso sentir que essa *culpa* emana energias numa frequência muito densa e baixa, e esse tipo de frequência, não constrói ou refaz nada para outros seres vivos, inclusive para você...

- Sim, eu quero ser formiga por um dia e farei isso não por culpa, mas porque quero realmente contribuir, ajudar e aprender...

terça-feira, março 26, 2024

Arlequim e o Obsessor


Arlequim conhecia muito bem seu obsessor favorito. Após tantos ataques, nosso Palhaço Cósmico sabia quais eram as técnicas utilizadas, pois seu Obsessor era muito criativo e inteligente. Afiado em Espadas e Afinado com as Copas, seu Obsessor já tinha tentando o ataque direto e ofensivo. Tentara se passar como amigo, se vestir como guia, demonstrando profundo interesse e lhe oferecido ajuda nos momentos em que Arlequim caíra, mas foi através dos ataques do *Reino de Paus* que Arlequim o reconheceu, e descobriu onde seu obsessor morava e foi ao seu encontro e o encontrou num num desses sonhos, projeções, transes, viagens malucas que geralmente a gente embarca entre um segundo e outro, mas lá estava ele, num canto, chorando e encolhido em algum lugar entre Marte e Feira de Santana dentro do nosso Andarilho.

- Quer um abraço? – perguntou. Sim, nosso Palhaço Cósmico agora se  compadecia da dor de todos, até dos seus inimigos favoritos. Sentia que queria o bem de todos, até de quem o queria mal.

- Por quê? O quê você quer de mim?

- Nada! Você está chorando, sinto que você precisa de um abraço. Quer?

Ele o olhou com desconfiança, mas aceitou seu abraço e chorou no seu ombro por ciclos que duraram uma eternidade de um macro-segundo.

- Você sabe que eu vou voltar a te atacar, não sabe?

- Sei!

- Você sabe que assim que eu me recuperar, eu vou continuar tentando te destruir com todo tipo de pensamento e impulso que você nem vai saber que veio de mim, pois eu vou disfarçar de desejos e impulso seus?

- Sei!

- E por que você ainda quer me abraçar?

- Porque eu te respeito na sua natureza de querer me prejudicar. Você deve ter seus motivos, mas seja lá o que você estiver aprontando ou deseje fazer para me prejudicar, eu também sei a minha natureza e a minha natureza é abraçar quem precisa com todo o afeto que eu posso dar. Sou assim, você me conhece tão bem, então sabe que não estou mentindo ou que estou com segundas intenções. Só sente, vai? *Matnis!*

- Mas não é natural! – disse ele se afastando – Você deveria me atacar, reagir com raiva e querer retribuir tudo aquilo que eu faço para te afetar. 

- Natural é sermos quem somos quando sabemos quem somos. Quer mais um abraço?

Ele olhou nosso Palhaço ainda desconfiado, mas voltou a chorar sem parar e disse:

- Quero!

E Arlequim abraçou o seu obsessor favorito, sem segundas intenções de mudar seu desejo de o prejudicar. Abraçou e ainda vai abraça-lo e querer o bem dele, e mesmo que o nosso Palhaco Cósmico saiba das mil técnicas de Desobsessão, magia ritualística, apometria, enfrentamento catimbozeiro e outras tantas práticas para o livrar de obsessores fisícos ou espirituais, mesmo sabendo que os sentimentos mais baixos e defensivos poderiam protegê-lo, nosso Arlequim optou pela *compaixão*. Ele poderia até estar errado, mas *se o amor e o carinho* não forem mais forte que o desentendimento de opiniões e crenças e/ou brigas kármicas que mantem essas obsessões, é melhor voltar a fingir que essas relações e ataques não existem. Ingenuidade? Bondade? Não! Prejudicar alguém, mesmo com todas as boas intenções, em qualquer nível ou por qualquer motivo, é o oposto de espiritualidade. Era isso que Arlequim sentia e era assim que ele faria e fez.

E lá ficou o Arlequim e seu Obsessor favorito abraçados. Arlequim com sua Flor no bolso, o Obsessor com a *espada ainda afiada*. Mas nosso Arlequim já sabia tudo que as espadas eram capazes de fazer pois já havia atravessado o *Reino de Espadas*. Já Sentia tudo que o *Reino de Copas* era capaz de fazê-lo fluir, pois já navegara nas águas profundas e rasas das emoções e agora com as ferramentas que o *Reino de Paus* lhe entregara, ele estava preparado para qualquer encontro, e em cada um deles, oferecer o que havia abundante em sua dispensa: *suas flores*.

Arlequim e a Solidão


No Hotel dos Corações Partidos, que fica na Cidade dos Solitários, Arlequim encontrou Pierrot, seu grande amigo, caído, combalido, depressivo, arrasado. O pobre companheiro de nosso Palhaço Cósmico, seu grande amigo, andava cabisbaixo, ombro encolhido, pensando absurdos, flertando com a insanidade, mas quando viu Arlequim, foi como se o Sol entrasse pelas frestas de seu leito escuro. 

- Pierrot, vamos tomar um café?

- Para quê, meu nobre amigo? Colombina não me ama, Colombina não me quer.

- Mas o café... ahhh... o café que eles servem aqui tem um poder mágico.

- Como assim?

- É um Café de Poder. É amargo para acordar seu fígado e te regenerar. A fragrância é tão forte e profunda que vai acordar a “Parte que Sabe” e te revelar que não podemos dar o nosso poder para ninguém. O problema não é o amor de Colombina que você não tem, o problema é acreditar que só podemos ter poder quando temos alguém.

- Ela também te deixou, Arlequim. Como você conseguiu estar assim tão bem, de cabeça erguida e ainda tendo forças para me vir me resgatar? Como conseguiu deixar de amá-la? 

- Eu não deixei de amá-la, Pierrot. Eu ainda a amo - disse Arlequim - E ela não me deixou, ela seguiu para onde ela desejava ir. E nisso, eu compreendi que o amor verdadeiro é não bloquear o fluir do outro que *FOI* com você e agora quer *SER* em algum outro lugar ou com outro alguém. 

- É aprender a deixar partir. É isso?

- Não, Pierrot. "DEIXAR" o outro partir ainda é ter *poder sobre o outro*. O amor não deixa partir. Quando dizemos que deixamos alguém ir, ainda é um jeito de nos convencermos que temos esse poder. Não temos. EU quis dizer, que, mesmo quando somos imaturos ainda de acreditar que amor é ter alguém só para si, podemos ancorar o nosso *Poder* sobre nós mesmos de compreender que os caminhos de alguém que amamos, não é poder manter alguém conosco ou deixar partir, o nosso poder pessoal é compreender, se for amor, que quando o outro se vai, o outro se foi, como o sol que se despede do dia, como as estrelas se despedem da noite. Eu percebi que a amava de verdade, quando não alimentei meu Oposto que desejava controlar o seu ir e vir. Amar é sempre um convite para naturalmente alguém querer estar conosco ou nos acompanhar. Não podemos ter esse poder de fazer alguém ficar conosco só porque nós queremos ou deixar partir como se o outro precisasse da nossa permissão para seguir. Isso não é amor. Amor é Amar e Amar é querer estar com quem a gente quer estar. O Oposto disso é apego, posse e controle.

- Acho que não sou tão evoluído quanto você. Ainda a quero só para mim. Não consigo ficar sozinho, sem ela.

- Aí é que está a questão, Pierrot. Se não conseguimos ficar sozinho e bem, acabamos delegando a estar com alguém esse "ficar bem". A solidão é uma erva-daninha em nosso jardim da liberdade, meu amigo, que precisamos observar e tratar para não contaminar as flores que estão brotando. E Evoluído eu não sou. Eu sou apenas alguém que percebeu que o Amor É tudo menos Ter, Possuir e Reter. Mas quer saber uma grande verdade?

- humm...

- Vem? Mas *só se voce quiser*, pois o café está esfriando e o café vai te fazer Sentir o que minha espada não vai mesmo conseguir ainda.

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