Arlequim conhecia muito bem seu obsessor favorito. Após tantos ataques, nosso Palhaço Cósmico sabia quais eram as técnicas utilizadas, pois seu Obsessor era muito criativo e inteligente. Afiado em Espadas e Afinado com as Copas, seu Obsessor já tinha tentando o ataque direto e ofensivo. Tentara se passar como amigo, se vestir como guia, demonstrando profundo interesse e lhe oferecido ajuda nos momentos em que Arlequim caíra, mas foi através dos ataques do *Reino de Paus* que Arlequim o reconheceu, e descobriu onde seu obsessor morava e foi ao seu encontro e o encontrou num num desses sonhos, projeções, transes, viagens malucas que geralmente a gente embarca entre um segundo e outro, mas lá estava ele, num canto, chorando e encolhido em algum lugar entre Marte e Feira de Santana dentro do nosso Andarilho.
- Quer um abraço? – perguntou. Sim, nosso Palhaço Cósmico agora se compadecia da dor de todos, até dos seus inimigos favoritos. Sentia que queria o bem de todos, até de quem o queria mal.
- Por quê? O quê você quer de mim?
- Nada! Você está chorando, sinto que você precisa de um abraço. Quer?
Ele o olhou com desconfiança, mas aceitou seu abraço e chorou no seu ombro por ciclos que duraram uma eternidade de um macro-segundo.
- Você sabe que eu vou voltar a te atacar, não sabe?
- Sei!
- Você sabe que assim que eu me recuperar, eu vou continuar tentando te destruir com todo tipo de pensamento e impulso que você nem vai saber que veio de mim, pois eu vou disfarçar de desejos e impulso seus?
- Sei!
- E por que você ainda quer me abraçar?
- Porque eu te respeito na sua natureza de querer me prejudicar. Você deve ter seus motivos, mas seja lá o que você estiver aprontando ou deseje fazer para me prejudicar, eu também sei a minha natureza e a minha natureza é abraçar quem precisa com todo o afeto que eu posso dar. Sou assim, você me conhece tão bem, então sabe que não estou mentindo ou que estou com segundas intenções. Só sente, vai? *Matnis!*
- Mas não é natural! – disse ele se afastando – Você deveria me atacar, reagir com raiva e querer retribuir tudo aquilo que eu faço para te afetar.
- Natural é sermos quem somos quando sabemos quem somos. Quer mais um abraço?
Ele olhou nosso Palhaço ainda desconfiado, mas voltou a chorar sem parar e disse:
- Quero!
E Arlequim abraçou o seu obsessor favorito, sem segundas intenções de mudar seu desejo de o prejudicar. Abraçou e ainda vai abraça-lo e querer o bem dele, e mesmo que o nosso Palhaco Cósmico saiba das mil técnicas de Desobsessão, magia ritualística, apometria, enfrentamento catimbozeiro e outras tantas práticas para o livrar de obsessores fisícos ou espirituais, mesmo sabendo que os sentimentos mais baixos e defensivos poderiam protegê-lo, nosso Arlequim optou pela *compaixão*. Ele poderia até estar errado, mas *se o amor e o carinho* não forem mais forte que o desentendimento de opiniões e crenças e/ou brigas kármicas que mantem essas obsessões, é melhor voltar a fingir que essas relações e ataques não existem. Ingenuidade? Bondade? Não! Prejudicar alguém, mesmo com todas as boas intenções, em qualquer nível ou por qualquer motivo, é o oposto de espiritualidade. Era isso que Arlequim sentia e era assim que ele faria e fez.
E lá ficou o Arlequim e seu Obsessor favorito abraçados. Arlequim com sua Flor no bolso, o Obsessor com a *espada ainda afiada*. Mas nosso Arlequim já sabia tudo que as espadas eram capazes de fazer pois já havia atravessado o *Reino de Espadas*. Já Sentia tudo que o *Reino de Copas* era capaz de fazê-lo fluir, pois já navegara nas águas profundas e rasas das emoções e agora com as ferramentas que o *Reino de Paus* lhe entregara, ele estava preparado para qualquer encontro, e em cada um deles, oferecer o que havia abundante em sua dispensa: *suas flores*.